terça-feira, 1 de novembro de 2011

Pleonasmos comprometem objetividade do texto dissertativo

Repetição de ideias pode descontar meio ponto na nota total da redação.
Projeto Educação dá exemplos de redundâncias que são vícios de linguagem.


segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Está em dúvida sobre o uso de "mesmo" ou "mesma"?


Mesmo

Você sabe utilizar o pronome?

Solange L. Marcondes*
Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
Página 3
A célebre plaquinha e o erro crasso que geraram comunidades no Orkut
"Antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra-se parado no andar". A frase, colada ao lado da porta de elevadores em cada andar dos edifícios, traz o pronome "mesmo" empregado de maneira incorreta e virou motivo de piada na Internet.

Quem lê a frase percebe que ela é um pouco "estranha": quem é "o mesmo", que poderia estar parado no andar? Mas o que muita gente não sabe é que o motivo dessa estranheza é o emprego inadequado da palavra.

A placa que encontramos na porta dos elevadores é consequência de uma lei municipal aprovada pela Câmara de Vereadores da cidade de São Paulo. A norma obriga todos os edifícios da cidade a terem a tal placa na porta dos elevadores. E a lei estendeu-se por todo o país, difundindo o erro de gramática em edifícios de todo o Brasil.

O motivo do erro é simples. Diz a gramática que não se deve usar a palavra "mesmo" como pronome pessoal. A frase colocada nas placas dos elevadores deveria ser corrigida, e a palavra "mesmo" substituída por "ele": "verifique se ele se encontra..."

Esse erro ocorre porque, para evitar a repetição, muita gente utiliza "o mesmo", "a mesma", já que os pronomes "ele" e "ela" devem ser usados com cuidado. Na frase: "Conversamos com o juiz e o mesmo afirmou que...", tem-se a impressão de que não existe erro, uma vez que, para muitos, esse é um exemplo que segue rigorosamente a norma culta. No entanto, frases como essa são deselegantes. O melhor é substituir a palavra "mesmo" por um pronome pessoal "e ele afirmou que..." ou por um pronome relativo "o qual afirmou que...".

Outro exemplo corriqueiro: "Favor desconsiderar o nome do aluno José do 8° ano, pois o mesmo acabou de entregar a carta de advertência assinada pelo responsável". A forma correta é bastante simples, basta substituir "o mesmo" pelo pronome pessoal adequado: "ele" (...pois ele acabou de entregar a carta...).

Mesmo como pronome demonstrativo

Na verdade, o pronome "mesmo" é demonstrativo. Sua função é retomar uma oração ou reforçar um termo de natureza substantiva. Dessa forma, tem-se:

"Ele é uma pessoa extremamente caridosa e espera que eu faça o mesmo". Na frase, o verbo vicário (fazer) e o pronome demonstrativo "mesmo" (que equivale a isso), juntos, evitam a repetição do conteúdo da oração anterior. Temos, portanto, um exemplo correto do emprego da palavra "mesmo".

Já não é o caso do seguinte exemplo: "Aos repórteres, o bandeirinha que anulou o gol afirmou conhecer as novas regras e o significado das mesmas". O emprego incorreto deve ser corrigido para "Aos repórteres, o bandeirinha que anulou o gol afirmou conhecer as novas regras e o significado delas".



Sem medo do 'mesmo'

Para usar corretamente a palavra "mesmo", observe as seguintes regras:
  • A palavra "mesmo" pode ser usada com valor reforçativo: "Ele mesmo recebeu os convidados". "Ela mesma recebeu os convidados".
  • A palavra "mesmo" como adjetivo, com sentido de adequado, conveniente, exato, idêntico etc.: "Seu projeto é mais bom que ruim. Forma correta de se usar o adjetivo, pois se comparam qualidades de um mesmo ser".
  • "A leitura é ela mesma infinita".
  • A palavra "mesmo" e o período composto por subordinação (as formas reduzidas são mais enfáticas): "Mesmo ferido no braço, o assaltante voltou para a sala de projeção e assistiu ao fim do filme". Por ser um texto jornalístico, optou-se pela forma reduzida da oração subordinada adverbial. "Mesmo que", "ainda que" e "embora" são conjunções adverbiais concessivas que exprimem um fato contrário ao da oração principal.
  • A palavra "mesmo" usada como advérbio. Nesse caso, a palavra "mesmo" possui sentido de "até", "ainda" etc: "Ele recebeu os primeiros socorros próximo à praia, mas como seu estado de saúde era bom, foi liberado ontem mesmo". "De acordo com as empresas especializadas, ainda são muito poucas, mesmo nas grandes capitais, as instituições que adotam circuito fechado de tevê (CFTV) com sistema digital, que, assim, promete ser a grande vedete da segurança nas escolas nos próximos anos".
  • Expressões como "dar na mesma"; "na mesma" ou "dar no mesmo". Essas expressões são corretas e indicam o sentido de "no mesmo estado", "na mesma situação": "A sua situação continua na mesma". "Com rendimentos tão baixos, deixar o dinheiro na conta corrente ou na poupança dá no mesmo".
*Solange Lauro Marcondes é professora de redação do Colégio COC-Universitário, de Santos (SP).
Disponível em: http://educacao.uol.com.br/portugues/mesmo-voce-sabe-utilizar-o-pronome.jhtm

A leitura: condição para a escrita consciente?

A leitura: condição para a escrita consciente?

Veja cinco dicas para fazer uma boa redação

  • 1

    Dissertação e narração
    O candidato precisa saber a diferença entre dissertação e narração. "O texto dissertativo é aquele por meio do qual se faz comentário a respeito de uma questão em debate e o comentário é expresso de maneira direta por meio de conceitos e julgamentos. Diferente do texto narrativo, em que a opinião está implícita"
  • 2

    Leitura da coletânea
    A prova de redação começa com uma leitura atenta da proposta. "O aluno costuma pegar um trecho isolado, que lhe é mais familiar, esquecendo que na proposta tudo é correlacionado. Tem que ler o que está na coletânea e não o que está na cabeça dele"
  • 3

    Posicionamento
    "É preciso assumir uma posição. O que se quer medir com isso é se o candidato já tem opinião própria, se tem capacidade de fazer uma reflexão personalizada"
  • 4

    Argumentação
    "É preciso argumentar bem. O argumento não é prova de verdade.  O argumento é bom quando tem relação com que pretende sustentar e quando é pouco refutável."
  • 5

    Capriche na linguagem
    Além da correção gramatical, o candidato deve organizar bem as frases. "Pegue a sua própria linguagem e escreva com capricho. Não tente usar termos que você desconhece."
Fonte: Francisco Platão Savioli, supervisor de gramática, texto e redação do Anglo VestibularesDisponível em: http://vestibular.uol.com.br/ultimas-noticias/2011/10/03/redacao-enem.jhtm

sábado, 8 de outubro de 2011

DO ENEM PARA A VIDA


Do Enem para a vida
10 dicas para a prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio que são úteis também no dia a dia
Atenção ao que se propõe - Uma leitura cuidadosa da proposta de redação evita que o candidato fuja do tema ou só o tangencie.
Examine a antologia - Trechos selecionados pela prova cumprem a tarefa de provocar a reflexão acerca da situação-problema em questão.
Siga as instruções - Desrespeitar o mínimo de 8 e o máximo de 30 linhas escritas, bem como não entregar a prova à tinta, podem desclassificar o candidato.
Faça um rascunho - É nessa etapa que se organizam as ideias, esquematizando-as em parágrafos para que se organizem segundo a estrutura clássica da dissertação: introdução (apresentação da tese a ser defendida); desenvolvimento (argumentos que justifiquem a tese); conclusão (parágrafo final em que se expõe uma solução ou desfecho para o tema).
Norma culta - O domínio da língua não implica necessariamente um texto rebuscado. O ideal é que seja correto e simples. Convém evitar períodos longos demais e vocabulário pedante, bem como clichês e generalizações vazias.
Marcas de oralidade - Expressões da fala cotidiana, como "né", "ok" ou "tá, por exemplo, não têm lugar numa redação. Palavras obscenas também devem ser evitadas, a menos que indispensáveis ao tratamento do assunto.

Sem internetês - Abreviações do tipo "vc", "hj", "td", etc., podem tirar pontos de uma redação que não está na situação de comunicação que exige o internetês. Nenhum leitor é obrigado a entender a linguagem dos computadores. Convém não usar nenhum tipo de abreviação não explicada, pois se corre o risco de fazer uma abreviação equivocada.

Manter a pessoa do discurso - Convém manter a mesma pessoa do discurso ao longo de todo o texto - seja a 3ª do singular ("entende-se que ela tenha agido assim...") ou a 1ª do plural ("vivemos uma era tecnológica...").

Revisão final - É aconselhável ler o texto depois de terminá-lo, para que não passem possíveis deslizes gramaticais, erros de concordância, etc. Além disso, repetições e redundâncias, comuns quando se escreve com pressa, podem colocar a redação a perder. 
Exercite - Escrever e reescrever textos ajuda a criar hábito. 


Disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=12359

Cuidado com a crase

O sinal indicativo da crase sobrevive apesar de seus detratores; saber empregá-lo pode reforçar a mensagem e evitar dúvidas de sentido

Chico Viana

Poucos assuntos geram tanta polêmica no domínio da gramática quanto a crase. Não foram poucos os que já se manifestaram contra ela. O deputado João Hermann Neto, falecido em 2010, chegou a apresentar um projeto de lei para extingui-la. Alegava que "o acento não faz falta", trata-se de um "sinal obsoleto que o povo já fez morrer". O humorista Millôr Fernandes parece ter opinião idêntica. Em entrevista aLíngua, afirmou que "se todo mundo erra na crase é a regra da crase que está errada". O escritor Moacyr Scliar identificou um "medo existencial" a ela, como se visse um traço hamletiano nas dúvidas sobre o seu emprego. Crasear ou não crasear - eis a questão.

Reconhecendo que a crase parecia mesmo ter-se transformado num "grave problema ortográfico e existencial", o poeta Ferreira Gullar cunhou há décadas aforismos sobre o assunto. O mais popular deles é o de que "a crase não foi feita para humilhar ninguém". Gullar a defendia, criticando escritores, jornalistas e escrevinhadores que "tremiam diante de certos aa", mas suas palavras acabaram servindo de argumento aos que a detratavam. Entendeu-se que ele pretendia livrar as pessoas da dolorosa obrigação de crasear, e não aconselhá-las a estudar português. Uma das justificativas de Hermann para seu projeto foi a de que a crase "só serve para humilhar". Dava a entender que a extinção do "acento" (sic) pouparia os brasileiros do vexame de não saber usá-lo. 
(...)


A fórmula infalível
Um simples procedimento pode determinar o uso ou não do acento indicativo de crase
Uma dica para saber se o a recebe acento indicativo de crase é substituir a palavra feminina que vem depois dele por outra masculina. Caso no masculino ocorra aglutinação (ao, aos = a+o, a+os), no feminino há crase (à, às = a+a, a+as). Compare:

Petra vai ao distrito amanhã. (a+o) - Petra vai à cidade amanhã. (a+a)
Meu estojo é semelhante ao seu. (a+o) - Minha bolsa é semelhante à sua. (a+a)

"Aquele" e "aquilo" não são formas femininas mas a crase pode ocorrer antes deles, pois começam por a : "Deu àquele amigo o melhor que tinha", "Não faça mais referência àquilo".





MAIS QUE A PRESENÇA DA PREPOSIÇÃO


"De moda a eletrônicos": o a não recebe acento por ser só preposição. E permaneceria sem mesmo se viesse antes de termo feminino, para se correlacionar com "de"

Com ou sem crase?
As várias situações em que o uso da crase é (ou não) indicado
1. O acento indicativo de CRASE OCORRE: 
  • Antes das palavras "casa", "distância" e "terra", quando estão determinadas: "Depois de muito viajar, cheguei à casa de meus avós", "O acidente ocorreu à distância de dois metros da amurada", "Volto à terra de meus pais". Caso inexista determinação, não ocorre a crase: "Depois do almoço, ele voltou acasa", "Observou a cena a distância" "O avião desceu a terra", "Depois de meses, os marinheiros voltaram a terra";
  • Antes de nomes próprios desde que venham antecedidos das locuções, ocultas, "à moda de", "à maneira de": "Joaquim escreve à Graciliano Ramos". No entanto: "Joaquim escreve a Graciliano Ramos" - caso ele escreva paraGraciliano;
  • Antes dos numerais indicativos das horas: "Chegou à uma hora.", "João saiu àstrês horas". Mas "Pedro sairá a uma hora qualquer" (hora indeterminada).
  • Nas locuções adverbiais, prepositivas e conjuntivas formadas com palavras femininas: à vista, à deriva, à toa, à máquina; à custa de, à mercê de, à feição de; à medida que, à proporção que etc. Mas: "Escreveu a lápis" (lápis é masculino).
Atenção: em "Resolveu atender a nossas súplicas", o a é apenas preposição. Constituiria um erro acentuá-lo. Errado também seria escrever "Resolveu atender asnossas súplicas", pois nesse caso haveria menção apenas ao artigo.
2. NÃO HÁ CRASE antes de:
  • Palavra masculina: Passeia pela fazenda a cavalo;
  • Palavras repetidas: Fez a tarefa passo a passo;
  • Verbo no infinitivo: Estava a cantar no banheiro;
  • Artigos e pronomes indefinidos: "Fez referência a uma moça do bairro", "Não devo nada a ninguém";
  • Pronomes interrogativos, demonstrativos (com exceção de "aquele", "aquela", "aquilo"), pessoais, relativos e de tratamento: "A que matéria te referes?", "Estamos atentos a essa nova tendência do mercado", "Entregueia ela o memorando", "A festa a que me referi ocorreu ontem", Afirmo a Vossa Senhoria que não menti";
  • Após preposição: "Chegou desde a semana passada", "Jurou perante a filha que era inocente".
Atenção: a regra acima explica a inexistência do acento grave sobre o "a(s)" em frases do tipo "Ficarei lá até a 1h.", "Está comigo desde as 19h", "O início do espetáculo está marcado para as 21h". 
3. Quando se PODE OU NÃO indicar a crase:
A indicação da crase é facultativa antes de pronomes possessivos e de nomes próprios do gênero feminino, pois eles podem vir ou não precedidos de artigo. "A professora fez um elogio a(à) minha redação", "Dei a(à) Laura o melhor de mim".
Outros casos
  • Há crase antes do pronome relativo "que" quando a preposição está fundida a um pronome demonstrativo: "Esta saia é igual à que você viu no shopping". No masculino, teríamos: "igual ao que".
  • Há quem questione o sinal de crase em locuções adverbiais com palavras femininas, alegando que no masculino não há o artigo. Ninguém diz "Escreveuao lápis". Logo, não haveria "Escreveu à caneta". Mas sem o acento pode-se confundir preposição com artigo. O risco não existe se o núcleo do adjunto está no masculino. Não se interpreta o a como artigo em "Furou o ladrão acanivete." O mesmo não se pode dizer de "Furou o ladrão a faca", em que se pode entender, na ordem indireta, que "a faca furou o ladrão". Se alguém "cheira a alecrim", exala o odor do arbusto; se "cheira a alfazema", pode estar aspirando o aroma. Por isso, orienta-se indicar a crase nessas locuções.
  • Exceção possível é "a distância". Mesmo sem determinação, registra-se crase para evitar confusão. "Percebeu o menino à distância" (o menino foi percebido "ao longe"). "O engenheiro avalia à distância" (de ponto distante). Sem acento, a distância é que foi percebida e avaliada.



PALAVRAS REPETIDAS


"Dia a dia": a crase não ocorre entre palavras que se repetem, o que é seguido pelo anúncio publicitário

Estratégias de estudo
A própria definição de crase (fusão de preposição com artigo) aponta as melhores estratégias para o seu estudo. Uma delas é procurar reconhecer a regência dos verbos e nomes que transitam para seus complementos por meio da preposição a. Alguns desses verbos são "dar", "assistir", "referir-se", "ascender", "fugir", "aludir". Entre os nomes, podem-se citar "avesso", "infenso", "hostil", "alergia", "movido", etc.
Distinguir a presença do artigo é a outra condição para que se assinale corretamente a crase. Nem sempre uma palavra do gênero feminino está usada com sentido definido. Isso depende, muitas vezes, da intenção do falante. Eis alguns exemplos do uso genérico dessas palavras: avesso a badalação, infenso a crítica, hostil a balbúrdia, alergia a laranja, movido a adrenalina. Nesses casos os monossílabos grifados são preposições e, obviamente, não podem receber o acento grave. 

Disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=12408

A informática e suas armadilhas

PASQUALE CIPRO NETO



Quando essa gente a quem pensar dói interfere na nossa vida... Aula de lógica neles! Que tal aprender a prever?


NA SEMANA passada, mencionei a falta que fazem as aulas de filosofia no ensino médio. Na verdade, não é só no ensino médio que elas fazem falta. A julgar pelo que se vê nas decisões tomadas por profissionais de nível superior de diversas áreas do saber, também na universidade a filosofia e a lógica parecem artigo raro.
Um bom exemplo se vê nos "corretores ortográficos" de certos programas instalados nos computadores. Escrevo este texto no Word e vejo que o tal corretor me "corrigiu" quando, no parágrafo anterior, escrevi "a falta que fazem as aulas...". O geniozinho quer que eu troque "a falta que fazem as aulas" por "as faltas que fazem..." Sem comentário.
Bem, pensando melhor, com comentário (com perdão pela cacofonia de "com comentário"). A coisa já começa mal no nome da tal ferramenta ("corretor ortográfico"). Como se sabe, a ortografia se ocupa da sistematização da grafia, que deve seguir as convenções adotadas. Se houvesse "erro" (não há) em "a falta que fazem as aulas de filosofia" e se o certo fosse "as faltas que fazem as aulas...", o problema seria de sintaxe, e não de ortografia.
Se o corretor ortográfico quiser ser de fato um corretor ortográfico, deve limitar-se a apontar erros de grafia, ou seja, deve grifar "excessão", "ascenção", "hortência" e casos afins. E é só o que o infeliz do programa consegue fazer direito, visto que, se alguém escrever "secretaria" em vez de "secretária", "esta" em vez de "está", "saia" em vez de "saía" ou "republica" em vez de "república", o "corretor" nada dirá, por uma razão bem simples: ele lê mal, ou melhor, não sabe ler mesmo.
Quem programa esses programas (com novo perdão, desta vez pela redundância) ainda não conseguiu fazer algo efetivamente bom no que diz respeito a apontar problemas de construção de texto (nexo, concordância, propriedade vocabular etc).
Quer ver outra delícia da informática? Prepare-se. A greve dos correios nos priva do recebimento de diversas contas, cujos emissores querem que nos lasquemos, ou seja, ou pagamos em dia ou pagamos em dia, do contrário...
Pois bem. Entrei no site de uma das empresas que me prestam (des)serviço. Entrei, é claro, para obter a segunda via da conta (a primeira deve estar presa em alguma montanha de correspondência não entregue). Descobri que é preciso cadastrar-se para obter a segunda via. Lá fui eu, fiel cordeirinho. Preenchi isto e aquilo até que... Até que se pedem duas informações que se obtêm numa conta da tal empresa... Belíssima piada, e das brabas!
Como posso ter à mão dados que constam numa conta da empresa se estou pedindo a segunda via de uma conta dessa empresa? Antes que alguém diga que basta pegar uma conta antiga... É melhor parar! Se estou no inferno, não tenho conta antiga comigo (há coisas melhores para levar para o inferno). Se quero pagar a conta atual, como faço, senhores gênios? Penduro-me no e ao telefone, ouço aqueles menus iniciais mais do que idiotas e espero sabe Deus quanto tempo até que alguém se disponha a me fornecer o código de barras, que terei de anotar ? E se estou no exterior? Como faço? Elaiá!
O fato, caro leitor, é que a muita gente pensar dói, mas, quando essa gente a quem pensar dói interfere na nossa vida... Aula de lógica neles! Que tal aprender a pensar, por exemplo, em "se isto, então aquilo"? Que tal aprender a prever? É isso.



Texto publicado na Folha de São Paulo - 06/10/2011






quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Uma aula do grande mestre Tostão

PASQUALE CIPRO NETO



O magnífico texto de Tostão poderia se referir não só às 'escolinhas' de futebol, mas também às escolas 'normais'


"A POESIA NÃO CANSA", disse o mais do que querido Tostão em sua belíssima coluna de ontem. Peço licença ao caro companheiro de muitos belos momentos vividos no ano passado, na África do Sul, para reproduzir trechos de seu texto:
"A criatividade, segundo estudos científicos, surge e se desenvolve na infância. As escolinhas (...) podem prejudicar a formação dos garotos. Eles deveriam, primeiro, brincar com a bola, se divertir, descobrir e aprimorar a habilidade e a fantasia para, depois, aprender as regras, a técnica e a tática. (...) As escolinhas costumam fazer o contrário. (...) Juan Pablo Varsky, argentino, colunista do 'La Nación', escreveu, há alguns dias, que o Barcelona é a poesia em movimento. Belíssimo. Acrescento que a maioria das outras equipes é o movimento sem poesia. Boa poesia não cansa. Extasia, mesmo quando o time empata, perde e até joga mal. (...) Logo após a final da Copa de 1970, o cineasta e poeta Pasolini escreveu que a Itália jogava como prosa, e o Brasil, como poesia. Hoje, o futebol italiano e o brasileiro são muito parecidos, pela marcação, pelos lançamentos longos e pelas jogadas aéreas. Jogam como prosa. A poesia ocorre em lances isolados. A prosa e a poesia são necessárias. Seria maravilhoso se o Brasil jogasse mais como poesia que como prosa".
Eu poderia simplesmente dizer que, mutatis mutandis, o magnífico texto de Tostão poderia se referir não só às escolas ("escolinhas") de futebol, mas também (e sobretudo) às escolas "normais", aquelas em que se deveria aprender muita coisa que lá não se tem ensinado (vejam-se os resultados do último ENEM, divulgados segunda-feira -por falar em ENEM, sugiro ao leitor que passe os olhos no magnífico texto de Elio Gaspari, também de ontem).
O trecho em que Tostão fala da ordem que as coisas deveriam ter nas escolinhas de futebol tem tudo a ver com o que acontece, por exemplo, nas aulas de língua e literatura, sobretudo no ensino fundamental. Entopem-se os alunos de nomenclaturas e afins, enquanto o texto fica ali, clamando por que alguém descubra os seus "dribles", "chapéus", "canetas", "jogadas sem bola" etc. O resultado disso é uma leitura dura do mundo, da vida, do (não) saber.
Intertextualidade, então, é artigo raro. Textos e textos são lidos sem que se desvendem para os alunos as conversas entre o texto que se lê e aqueles com os quais o texto que se lê "conversa", ainda que seu autor não tenha propriamente querido fazer referência a eles. Dou um exemplo: se o texto de Tostão fosse parar numa aula de língua ou de literatura (por que não?), o/a professor/a poderia fazer referência a estes versos da antológica canção "Língua", de Caetano Veloso: "E sei que a poesia está para a prosa / Assim como o amor está para a amizade / E quem há de negar que esta lhe é superior?".
Bem, aí certamente caberia ao/à professor/a estabelecer os nexos que há entre o que Tostão e Pier Paolo Pasolini chamam de poesia e prosa no futebol e o que Caetano quer dizer com os seus versos. Para ilustrar o que são a poesia e a prosa no futebol, o/a professor/a poderia, por exemplo, apresentar um dos mais sublimes lances da história do futebol, do qual o grande Tostão participou. Refiro-me ao ANTOLÓGICO gol do Brasil contra a Inglaterra, na Copa de 70. Está ao alcance de todos no YouTube. Como dizia o meu querido e saudoso Walter Silva, "só a loucura cura". No nosso caso (professores), a loucura é fugir do comum, fazer pensar, mostrar o belo, o mágico, onde estiverem.
E viva o grande Tostão! É isso.



Texto publicado na Folha de São Paulo, 14/09/2011


http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1509201103.htm

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Crônica (opinião)

CARLOS HEITOR CONY

A língua da serpente


RIO DE JANEIRO - Li que, na Inglaterra, estão pensando em criar um filtro para controlar a comunicação pela internet -que está sendo acusada de incentivar distúrbios e distorções que prejudicam a sociedade e os cidadãos. Não deixa de ser uma tentativa de censura, mas o furo é mais em cima.
Nas antologias escolares de antigamente havia sempre um pequeno poema de Fagundes Varela que toda uma geração decorava. O poeta perguntava qual era a mais forte, a mais letal das armas e respondia: a língua humana. Nem mesmo com o arsenal nuclear de hoje a língua perdeu a "pole position" na escala da destruição de que é capaz.
Tudo começa lá atrás. Se dermos crédito à fábula bíblica, foi a língua da serpente que expulsou Adão e Eva do Éden, donde podemos concluir que, se a serpente não tivesse língua, ainda hoje estaríamos no paraíso terrestre.
A tecnologia ampliou a malignidade da língua, tudo se pode fazer com ou por meio dela. Não adianta o tal filtro dos ingleses, que pode, no máximo, controlar a pirataria dos veículos audiovisuais, mas jamais controlará a língua daquelas comadres machadianas, patuscas e atentas nas janelas, vigiando a vida dos vizinhos. Isso sem falar na língua de economistas, políticos, formadores de opinião, técnicos de futebol e, naturalmente, todos os tiranos que, periodicamente, ajudam a desgraçar a humanidade.
Em Roma, no início do fascismo, Mussolini (que era bom de lábia) perguntou ao povo reunido na piazza Venezia: "Quereis manteiga ou canhão?". O povo respondeu: "Canhão!". Hitler e Stálin não fizeram por menos.
Ainda bem que Hamlet concordava em parte com Fagundes Varela, quando encerrou seu dilema dizendo que "o resto é silêncio". Houvesse silêncio no mundo, sem as comadres machadianas e se as serpentes não tivessem língua, as coisas estariam melhores.


http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2508201105.htm

OPINIÃO

Sacolas para compras, como escolher?

HELIO MATTAR



É preciso avaliar os impactos comparativos dos diversos meios para transportar as compras, buscando a solução de menor impacto negativo



O artigo de Miguel Bahiense, presidente do INP (Instituto Nacional do Plástico), publicado no dia 25 de julho nesta seção ("Sacolas plásticas: em vez de banir, educar"), faz uma recomendação incondicional e equivocada em favor do uso das sacolas plásticas descartáveis.
Por serem descartáveis, as sacolinhas são incompatíveis com um futuro sustentável no longo prazo.
Afinal, são gastas matérias-primas, água e energia, recursos da natureza, para gerar um produto usado poucas vezes e descartado com o lixo, em um processo com impactos ambientais envolvendo desde a extração das matérias-primas até o uso e descarte das sacolas, isto é, todo o "ciclo de vida" do produto.
É necessário avaliar os impactos comparativos dos diversos meios para transporte de compras, buscando a solução de menor impacto negativo. No começo de agosto, foi apresentado um estudo pioneiro, solicitado pela Braskem, maior produtora de resinas termoplásticas das Américas, feito pela Fundação Espaço Eco, especializada em estudos de ciclo de vida, com métodos internacionalmente reconhecidos.
Compara a "ecoeficiência" de várias alternativas de transporte de compras, analisando o impacto ambiental da cadeia produtiva e os seus custos diante da tecnologia e dos métodos de produção atuais, com diversos cenários de uso e de descarte da sacola.
Os cenários variavam em volume de compras, frequência de idas ao supermercado, frequência de descarte do lixo, tipo de matéria-prima utilizada na produção das sacolas, capacidade de carga, custo de cada sacola, número de vezes em que é utilizada, reutilização ou não como saco de lixo e o envio ou não para reciclagem.
Ao variar cada um desses itens, muda o resultado do estudo. Por isso, o uso de um estudo inglês no artigo aqui comentado em defesa do uso das sacolas plásticas descartáveis no Brasil é totalmente equivocado: as condições ambientais, a matriz energética e os hábitos de compra do brasileiro são bastante distintos dos do inglês.
O estudo brasileiro concluiu que: (a) com o aumento do volume de compras, melhora a ecoeficiência das sacolas retornáveis; (b) com o aumento da frequência de ida ao supermercado, melhora a ecoeficiência das retornáveis; e (c) com o aumento da frequência de descarte do lixo, com reuso das descartáveis como saco de lixo, melhora a ecoeficiência das descartáveis.
Assim, a conclusão varia conforme as características das compras e descarte de cada consumidor, melhorando ou piorando a ecoeficiência. A única coisa que não varia é que a descartabilidade não será uma escolha sustentável a longo prazo. Valerá sempre mudar os hábitos de compra e descarte e as formas de transporte de compras buscando melhor ecoeficiência.
Para isso, é importante a educação do consumidor quanto aos impactos ambientais e sociais das escolhas de consumo, como no trabalho do Akatu com apoio da Braskem, envolvendo mais de 1.460 escolas públicas e privadas da rede do Faça Parte. Educado, o consumidor vai demandar mais estudos de ciclo de vida para poder escolher com ecoeficiência cada vez melhor.


HELIO MATTAR, mestre e doutor em engenharia industrial pela Universidade Stanford (EUA), é diretor-presidente do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente.



http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2908201108.htm

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Metáforas...


SERENATA


Flauta e violão na trova da rua
Que é uma treva rolando da montanha
Fazem das suas.
Não há garrucha que impeça:
A música viola o domicílio
E põe rosas no leito da donzela.


(Serenata - Carlos Drummond de Andrade)



INTOLERÁVEL


Corrupção mata. Entender isso é fundamental para atacar um dos males que mais empatam o desenvolvimento socioeconômico e político do Brasil. Ainda há quem não veja a conexão entre corrupção e violência, mas elas estão intimamente ligadas.
Da mesma forma, devemos entender que a baixa eficiência e o mau funcionamento dos serviços do Estado estão tremendamente relacionados à cultura da corrupção, ao patrimonialismo, à falta de transparência e à baixa capacidade de mobilização social.
A morte da juíza Patrícia Acioli, no Rio, não é apenas um crime brutal. A execução de uma servidora pública correta e rigorosa com os crimes, principalmente os cometidos por agentes públicos, revela a força que as máfias têm no país. E o tamanho que elas adquiriram, graças à corrupção.
Quando a propina chancela e incentiva o desvio de conduta, torna-o cada vez maior. E chega a um ponto em que vê na lei um obstáculo que precisa ser removido, tirando do caminho quem a faz cumprir.
É na má política que se choca o ovo da serpente da violência policial e das relações espúrias entre poder de Estado e delinquência. Quem assistiu aos filmes de José Padilha “Tropa de Elite” e “Tropa de Elite 2″ pode ver como a propina de todo dia fortalece a mão que aperta o gatilho contra os inocentes.
A morte de Patrícia Acioli é uma afronta ao Estado democrático de Direito. Ela não é apenas mais uma vítima. Era alguém que, no desempenho de suas funções, buscava combater a barbárie de grupos que querem controlar a vida de quem mora na periferia e, claro, o próprio Estado.
Matar uma juíza revela enorme convicção da própria impunidade. É uma declaração de guerra às leis, à democracia e à sociedade. Assim como é inaceitável que o Brasil conviva com a execução de uma juíza, também não é mais tolerável convivermos com o nível de corrupção que tem marcado o nosso país.
Vemos, na mídia, como a Índia, país com problemas maiores do que os nossos, desperta vigorosamente para o combate à corrupção. E o que falta para o Brasil? Quanto mais indignada for a resposta da sociedade aos escândalos e aos homicídios de cada dia, maior será o poder de reação contra essas mazelas no âmbito do próprio Estado.
A autoridade pública da menor à maior se sentirá fortalecida e incentivada a agir contra a corrupção, que é, em si, uma forma de violência contra a coletividade.
A faxina, então, deixa de ser rápida, como se faz quando chega uma visita inesperada, e passa a ser permanente, vigorosa, profunda. É desse nível de exigência que precisamos. Se nos acostumarmos a deixar barato, perderemos o controle do que é público, do que é de todos nós.
* Artigo da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva publicado originalmente na Folha de S. Paulo em 19 de agosto de 2011.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Resenha

Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2


Finalmente chega aos cinemas o ultimo filme da maior franquia de filmes da historia do cinema. Aclamado pelos fãs, Harry Potter conquistou o público de todos os gêneros, tanto adultos quanto crianças. Adaptado da série de livros escrita por J.K. Rowling, a franquia não decepciona em seu ultimo episodio, emoção, romance, ação, um roteiro bem criado que prende o espectador, um show de efeitos especiais e vários outros motivos que fazem “Harry Potter e as relíquias da morte – Parte 2” ser, atualmente, um dos melhores filmes do ano.
Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte II
Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte II
Um dos filmes mais aguardados do ano vem com um ar diferente dos outros, o toque de humor que havia em seus antecessores não aparece neste filme. Mantendo a seriedade do filme anterior, Harry (Daniel Radcliffe), Rony (Rupert Grint) e Hermione (Emma Watson) continuam sendo perseguidos pelo exercito de Voldemort, eles estão em busca das quatro ultimas Horcruxes(Fragmentos da alma de Lord Voldemort) e se preparando para a luta final, que irá definir o destino do mundo dos bruxos e trouxas. O filme, diferente da parte 1, é mais ágil, ação do inicio ao fim, tendo mais ação que os outros sete filmes, deixando os espectadores ficarem animados com as lutas e perderem o fôlego com os efeitos especiais, como por exemplo, um surpreendente dragão branco e explosões de feitiços.
David Yates mostrou que estava certo ao dividir o filme em duas partes e que dava conta do recado, sendo fiel ao livro e deixando clara a mensagem que queria mostrar para as pessoas que acompanham apenas os filmes. O Filme se foca em mostrar a evolução de cada personagem e principalmente na do trio, que no começo eram apenas crianças e agora estão tentando derrotar Lord Voldemort colocando a vida deles em jogo.
Yates trouxe todos os personagens de volta a este filme para a batalha, deixando as pessoas nostálgica com os personagens que já não apareciam há muito tempo. Daniel, Rupert e Emma dão a melhor atuação deles dentro dos oito filmes da série. Não só a atuação deles que é notável, mas também as atuações de Ralph Flennes (Lord Voldemort), Matthew Lewis (Neville Longbotton) e Helena Bonham Carter (Bellatrix lestrange). Já no começo do filme, Helena mostra sua ótima atuação quando Hermione se transforma em Bellatrix para entrar no banco dos bruxos.
Não tem como sair do cinema sem a sensação de “tudo acabou”, sabendo que não vai ter mais nenhum filme do bruxo para assistir nos próximos anos. As pessoas que acompanharam a série desde o começo vão se emocionar, não por apelação emocional para você sair triste do cinema, e sim por terem crescido junto com os personagens e estar finalmente se despedindo do mundo bruxo depois de dez anos.
O mais recomendável é dar uma revisada nos filmes anteriores e se preparar para conclusão dessa série que merece ser vivenciada diante da telas do cinema. Essa saga já épica pode ter acabado, mas com certeza irá continuar na vida de muita gente e irá fazer muitas pessoas continuarem esperando suas cartas de Hogwarts.

A crítica do filme Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2 foi enviada pelo contribuidor Mikael Claro Nogueira. 

domingo, 24 de julho de 2011

OPINIÃO

ANTÔNIO GOIS

Samba do moreno doido


RIO DE JANEIRO - Na transmissão de rádio de um jogo da Copa América no domingo passado, o repórter, ao se referir a um jogador de nome Rincón, explicou que não era o mesmo que jogou no Brasil pois "aquele era moreno".
De imediato, o locutor corrigiu. Rincón -colombiano com passagens por Palmeiras e Corinthians- é negro, não moreno. Temendo soar preconceituoso, o repórter retruca: "É você quem está dizendo".
O caso é anedótico, mas exemplar da dificuldade que temos em lidar com o tema.
Estudo divulgado na sexta pelo IBGE mostra que a percepção que os brasileiros têm de si nem sempre bate com a avaliação dos outros.
Essa discrepância é gritante especialmente quando o entrevistado se diz moreno. Aos olhos dos entrevistadores, esses mesmos morenos seriam pardos (40%) ou brancos (26%). As respostas só combinam em 22% dos casos.
Nas pesquisas do IBGE, tradicionalmente, é o próprio entrevistado quem declara sua cor ou raça a partir de cinco opções (preto, pardo, branco, amarelo e indígena).
O estudo em questão destoa porque foi feito justamente para embasar mudanças.
Num contexto em que universidades adotam cada vez mais políticas para beneficiar grupos raciais normalmente excluídos do ensino superior, essa discussão torna-se ainda mais relevante.
Fica mais uma vez evidente, por exemplo, o absurdo que é a UnB exigir que candidatos à cota racial sejam entrevistados por uma banca para provar sua declaração.
Mais sensatas são a Uerj e outras 35 universidades. Se há o receio de fraude na identificação racial, melhor é agregar outros critérios, como exigir comprovação de pobreza ou frequência à escola pública.
Dessa forma, garante-se que a política beneficiará quem precisa, sem constranger candidatos à inquisição de um tribunal racial.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2407201105.htm

sábado, 23 de julho de 2011

OPINIÃO

MARINA SILVA

Não à repetição 

As instituições públicas estão acima de interesses partidários e pessoais. Tal premissa -fundamental para a democracia- tem a concordância absoluta de todos, da sociedade à classe política.
O que explica, então, que o Brasil caia sempre na mesma armadilha? Por que os governos ficam reféns de grupos com baixa representatividade política e social em busca apenas dos dividendos que a máquina pública lhes oferece?
Passam-se décadas, mudam os governantes e isso parece se perpetuar. As práticas reveladas no Ministério dos Transportes e suas autarquias não surpreendem pela novidade, mas, sim, pela repetição. Vemos, mais uma vez, interesses políticos e eleitorais se sobrepondo aos interesses do Estado e da sociedade.
É o atraso na política corroendo e subvertendo instituições pelas quais a sociedade lutou, a duras penas, ao longo de muito tempo.
O TCU, o Ministério Público, a Controladoria-Geral da União e seus congêneres são fruto de longa demanda popular por ética e transparência.
Se não funcionam com rapidez e eficiência, precisam do empurrão de todos. As autoridades públicas precisam ser salvas delas mesmas por meio da transparência, dos mecanismos de controle e da punição real e em tempo razoável.
Vamos aceitar como normal a ideia do "ah, é assim mesmo" ou, pior, de que os governantes nada podem fazer para mudar porque seriam inviabilizados pela sua "base"?
Que certas práticas são tão enraizadas que é melhor deixar como está? Que os recursos podem ser distribuídos pelos caciques políticos, sob ameaças de retaliação contra o interesse coletivo?
A complexidade das relações entre o Executivo e o Legislativo e a necessidade de maioria parlamentar que garanta a governabilidade não legitimam os acertos e negociações fora das luzes da transparência e das leis.
A verdadeira base do governante, a única capaz de intimidar a "base" do atraso, é a sociedade, e ela só fica de mãos atadas quando esquece disso.
Cada vez que a presidente disser "não" aos interesses espúrios, merece apoio do povo e, tenho certeza, o terá de grande parte do próprio Congresso.
As soluções para enfrentar os problemas não são simples, o que não isenta a sociedade de continuar vigilante, pressionando permanentemente os atores públicos a se conduzirem de acordo com os princípios do Estado democrático.
A crise nos Transportes não é mais um caso de corrupção.
É emblemática, pode ser aquele momento que permite inflexão definitiva, que dá liga às iniciativas que clamam pela mudança. É só uma das manifestações da longa crise política que temos o dever de enfrentar. Na democracia, não há lugar para a passividade.



MARINA SILVA escreve às sextas-feiras nesta coluna. http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2207201106.htm

OPINIÃO

MARTA SUPLICY

Quem cuidará de você?


Em 2030, os idosos brasileiros serão, segundo o IBGE, quase tão numerosos quanto os jovens. Esta é uma notícia positiva, pois estamos vivendo mais, e preocupante, pois não existe planejamento no atendimento adequado aos cuidados necessários que tal população exige -sejam médicos, domiciliares, de lazer, de alternativas profissionais.
O problema não é somente brasileiro. Os países desenvolvidos também estão diante de uma situação complicada, só que muitos estão enfrentando o desafio há décadas. Alguns conseguiram um planejamento exitoso.
Em 2030, os EUA terão 72,1 milhões de adultos acima de 65 anos, mais que o dobro do número de idosos em 2005. Os americanos têm por regra poupar para chegar à terceira idade em condições de viver em lugares planejados, em comunidade. Os que podem, planejam essa independência e assistência.
Na França, com grande número de idosos solitários, a ex-ministra do Trabalho Martine Aubry criou um programa que capacitava jovens a serem visitadores de idosos. Eles realizavam compras, levavam os idosos para caminhar, pegavam o metrô para levá-los à fisioterapia, a consultas.
No Brasil, os idosos têm aposentadoria. Porém, mais que tudo, contam com a família. Para falar a verdade, com as mulheres da família. A filha solteira, a que larga o emprego para cuidar dos pais, a casada que abriga o idoso em sua residência. E sempre houve uma ojeriza da família ou do próprio idoso a ir para uma casa de repouso. Isso está mudando: mais pessoas envelhecem e a família não dá conta.
Um grande número de mulheres não querem ou não podem mais abdicar de suas profissões para cuidar dos pais.
Um enorme número que tinha como "natural" cuidar dos filhos e depois dos pais abriu mão desse programa, por necessidade ou por mudanças de expectativa de realizações femininas neste século.
A Constituição de 1988 fez avanços importantes, mas envelhecemos em plena fase de desenvolvimento, com um país sendo construído em todas as áreas. A redução da pobreza extrema que tivemos é recente. Parte dos idosos são chefes de família e não têm como pensar em si mesmos.
Quando o idoso não chefia a família, mas depende dela, enfrenta graves problemas.
Quem tem um pouco mais de poder aquisitivo não encontra bons cuidadores com facilidade. Falta qualificação. Quem procura casas de repouso encontra, nas mais acessíveis, péssimos serviços.
Existem programas em andamento, mas precisamos acelerar soluções. Em particular, ações que façam frente ao crescimento de demandas de saúde, previdência e assistência social. E, urgentemente, capacitar cuidadores. O jovem Brasil envelhece rapidamente.


MARTA SUPLICY escreve aos sábados nesta coluna. http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2307201106.htm